O lobisomem de Cardeal
Periferia do subdistrito de
Cardeal, - Virtuália.
Xerequéia encheu o coxo de Libélula
de lavagem que ganhou no decorrer do
dia:
-Nossa,
Lili, como você cresceu neste último ano! Já deve de estar com mais de cinquenta
quilos! Lembro-me quando o Paulinho Goró “me” deu você de presente... você era
tão magrinha e frágil que coloquei o nome em você de Libélula! – conversava com sua porquinha de
estimação e, continuava:
-
Vem comer em paz que eu vou dormir hoje eu estou muito cansada! A noite já está
alta e amanhã, apesar de ser sábado, tenho que sair à procura de sucata recicláveis! Xerequéia fechou a porta da antiga cabine
do DeSoto modelo 1952, deixada pelo amigo Goró. Apagou a vela e, em seguida,
dormiu no surrado colchonete.
Por volta da meia noite, daquela
sexta-feira treze de agosto, a sempre alegre Xerequéia, acordou de sobressalto
com um rosnado horrível, mas não se atreveu a se levantar para ver; por uma
fresta viu um vulto horrível passar correndo rumo à sanga.
Amanheceu e, a catadora de
recicláveis, chama por Libélula:
-
Cuch... cuch...cuch...cuch...cuch!
– e nada de ela dar sinal de vida.
-
Ah! Meu Deus! Foi o lobisomem que eu vi ontem à noite; ele veio buscar a minha Lili! – chorava a Xeré.
Logo Paulinho Goró, ao ficar
sabendo, veio para prestar ajuda à velha amiga:
-
Tem razão “mana”, foi o lobisomem! Olha as pegadas dele; parece de porco, mas é
bem maior! Acho que a porquinha “já era”! Estão dizendo, por aí, que em vários
lugares do povoado, estão sumindo com porcas tipo a Libélula! Tem lobisomem na
área “mana”!
...
Dois meses se passaram e, numa
noite agradável de primavera, Xerequéia acorda assustada com algo fuçando e
fungando os seus pés:
-
LIBÉLULA! Você voltou? Onde é que você estava Lili? – realmente era a sua porca
de estimação.
-
Nossa como você está gorda, aliás, barriguda... ora...ora... você está prenha,
não é?
– falava isso cobrindo o focinho da suína de beijos e afagos.
No outro dia Paulinho foi o
primeiro, a saber, da novidade e disse cheio de sapiência:
-
Então não foi lobisomem - ou foi, mas a Lili conseguiu fugir assustada e só
agora achou o caminho de volta! Olha “mana”, ouvi dizer ontem à noite, lá no
meu carrinho de churrasquinho, que na fazenda do Timbó sumiram duas porcas de
raça! Hoje vou ficar de campana, à noite, e pegar esse tal de lobisomem numa
armadilha de laço, isto se ele aparecer! –
e assim foi feito.
Na terceira noite, Paulinho sempre
ia depois da meia noite quando encerrava seu expediente no seu serviço. Escondido
e cochilando, perto do cercado da Libélula, acordou por volta das cinco da
manhã com um barulho de alguém tropeçando na armadilha e caindo no laço:
-
Peguei-te, lobisomem!
– gritou Pulinho.
Paulinho deu uma única e certeira
paulada na testa do lobisomem que morreu instantaneamente. Goró fez um dos seus
costumeiros alvoroço e foi tão grande que em dez minutos já tinha uma multidão
para ver o estranho animal. Foi Pauli, fumante aloprado, acostumado a caçar,
que reconheceu o bicho:
-
Isto não é lobisomem coisa nenhuma! É um javali ou queixada e é adulto! O tamanho
enorme das presas dá para ver isto!
De repente:
-
Ohhhhh... ohhhhhhh!
– espantadas e com meiguices algumas senhoras soltaram esta exclamação. Era a
porca Libélula que veio até ao javali e começou a esfregar seu focinho no do
amado morto. Todos perceberam o acontecido. O javali veio visitar a sua amada e
se deu mal.
Xerequéia levou a porca imensamente
gorda de volta para seu cercado e Paulinho ficou de dar um sumiço na carcaça do
animal morto. E deu. A partir da noite seguinte o espetinho com churrasquinho
de carne de porco, vendido por ele, era especial e de carne exótica, mas
ninguém notou a diferença na aparência da carne. Ele também não falou para ninguém. Só o sabor
que era mais delicioso.
Alguns meses depois Libélula deu
cria a uma ninhada de nove leitõezinhos estranhos. A ninhada toda foi prometida
ao Paulinho Goró pela sua amiga Xerequéia.
A população de Virtuália iria
experimentar, em breve tempo, um novo churrasquinho no palito preparado pelo “expert”
Paulinho Goró:
Churrasquinho de carne de
javaporco.
VVV
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