sábado, 10 de novembro de 2012

VIDA EM VIRTUÁLIA


“Quem acredita nos sonhos não espera dormindo! “ - Lefus

             Há sete anos, verão de 2005.
         Paulinho Goró foi alcoólatra durante vinte anos dos seus trinta e oito vividos. Perdeu tudo que herdara, como único dono, da fortuna da sua falecida avó paterna. O álcool achou que o tinha derrotado, mas Goró deu a volta por cima. Já tem sete anos que está sóbrio, por livre e espontânea vontade. Como tem pouco estudo, menos cultura ainda, nunca precisou trabalhar e, não ter profissão, se determinou:
         - Vou ser o dono do maior restaurante especialista em galeto assado da cidade e, também caldos e ensopados! Ah! Se vou, vou sim!- tinha esses delírios quando estava faminto e não tinha nada para comer.
         - Mas como? Se me tornei um paupérrimo e sobrevivo de catar materiais recicláveis? – pensava Goró numa sexta-feira de lua cheia, exuberante, à meia noite, perto onde o Ribeirão Limpo deságua no Rio do Peixe. Ali ele nunca tinha passado antes. Parou de abrupto ao ouvir um batuque e um canto esquisito. Era Juliano, pai de santo, delegado de Oriximbanda – que retornara à Virtuália após a morte do agiota Black Hulk (*) - com uma senhora, aparentemente, rica e não era de Virtuália, pois nunca a vira antes.
         Ficou escondido até terminar o ritual. Meia hora depois que o Ju e a dona, no carrão importado, foram-se embora e, quando voltou o silêncio, ele saiu detrás da moita alta e foi até ao local do despacho e viu:
         - Caramba, o que temos aqui: - dois frangos assados, três garrafas de champanhe francês, três garrafas de vinho chileno, uma caixa com lantejoulas, plumas, paetês e purpurinas... mais... bacalhau, carne seca, um fardo de refrigerantes e... e... cinco notas de cem reais amarradas uma na outra!
         Como estava com seu carrinho de catar sucatas, não pensou duas vezes e o encheu com tudo e saiu dali rapidinho, não se esquecendo de ir apagando as marcas da roda do carrinho. Numa certa distância notou que alguém se aproximava numa Variant azul cobalto de portas rosa e se escondeu no mato para ver o que aconteceria.
         - Pô!  Não é possível! O Babacaaxé e o Boborixá não podem ter levado tudo, eles não existem! Como pode ter sumido tudo em menos de meia hora? – era o Juliano que voltou para levar para si as oferendas:
         - Cacete, fora os R$500,00, tinha mais de dois mil em mercadorias e sem falar na caixa com materiais para a minha fantasia que aquela rica otária comprou! Cacete...cacete...cacete - e foi embora praguejando.
         Paulinho, em poucos minutos, chegou ao seu barraco, perto da sanga no fim da Rua Lúcifer:
         - Ahhhhh! Frango assado, farofa e refrigerante, que banquete! – comeu até se empanturrar e foi dormir.
         No dia seguinte, Goró, foi até ao vistoso e ornamentado templo da Igreja Sideral Eva-Angelica de Virtuália e, como sabia que o pastor Jairo Edson, comprava muamba, vendeu todas as bebidas para ele. A caixa com os materiais para fantasia vendeu para o rival carnavalesco do Juliano e, vendeu caro, pois era produto vindo do Rio de Janeiro.
         Juliano passou a mudar os locais dos despachos que fazia todas as segundas, quartas e sextas-feiras. Mas, Goró, estava atento e esperto.
         Sem querer o Boborixá e o  Babacaaxé ajudavam um ser humano: - Paulinho Goró. E, este ser humano, ajudava a manter limpas as margens do Rio do Peixe, recolhendo as oferendas que sujavam o meio ambiente.
         Hoje, graças à “ajuda” do pastor Jairo Edson e do idiota do Juliano, que passou a acreditar que as suas entidades o estavam atendendo, por conta das oferendas cada vez mais caras, Goró nunca mais passou fome. Coincidência ou não, Juliano, passou a atender em dobro suas consultas, pois eram muitos os amores que voltavam aos antigos donos, gente que se livrava de encosto, má sorte e até gente que sumia por conta das entidades.
         Nos dias de hoje, Goró já completou um ano que vende churrasquinhos especiais no carrinho que comprou da mãe do desaparecido Cilon, o Massa Bruta (**). Não mora mais perto da sanga, mora nos fundos do quintal do Juliano, num quarto e sala alugado e mobiliado na Rua Aparício Ribeiro esquina com a Rua Índio Largado.
         Alguém duvida do sonho do Goró?

 (*)   Leia “Pavão Misterioso”
(**)  Leia “Negócio da China” 

         

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