Salada de Rabanetes
- Lê, você pediu salada de rabanetes e pepino
japonês no almoço de hoje, não pediu? – perguntou-me a Rô– minha patroa –
na porta da garagem onde eu me preparava para sair de carro.
- Sim! Já sei: - Não comprei! Vou à quitanda
buscar, rapidinho!
Saí troteando
e uma nuvem enorme, em formato parecido
com uma explosão nuclear, chamou-me a atenção lá longe no horizonte. Distrai-me
e pisei numa poça d’água que tinha na calçada, em frente ao restaurante, onde
acabaram de fazer a limpeza da parte da manhã.
- Mas que droga! Logo hoje que vou participar
de uma licitação com a prefeitura? – olhei no meu relógio de pulso e
raciocinei:
- Ainda faltam duas horas para a reunião e
terei tempo de ir até lá no Graxaim para engraxar estes meus sapatos! – e
foi o que fiz, logo após pegar o molho de rabanetes na quitanda, já que o
pepino japonês tinha na geladeira de casa.
- “Se assenta” na cadeira, seu Lê, será meu
primeiro freguês de hoje e já vi que terei sorte, Eh! Eh! Eh! – disse-me o
engraxate com sua costumeira e risonha simpatia e prosseguiu:
- Tome este gibi e vai se distraindo
enquanto faço meu serviço, seu Lê; eu sei que o senhor gosta!
Peguei a
conservada revista-em-quadrinhos e vi a data: Novembro de 1.952 e pensei:
- Caramba, este gibi de Tarzan tem a minha idade
e eu não tenho na minha coleção, falta só ele: o número dezessete, da primeira
série! – comecei a ler já pensando em comprá-lo do Graxaim.
Do lado,
da cadeira de engraxate, tem uma loja de presentes finos e de lá saiu uma
senhora que chamava a atenção com seus traços nórdicos, muito bonita e bem
trajada e, vi quando ela passou perto onde a velha e esfarrapada Lia Polaca
fazia ponto de mendicância:
- Ô minha filha, “me” dê uns trocados para eu tomar um
café?- “implorou” a velha.
- Não, eu não tenho trocado! – falou
asperamente a sisuda beldade.
- Tome, minha boa velha! São trocados suficientes para
seu café e seu almoço de hoje! – disse um representante fiel da mais
pura raça africana, entregando-lhe uns “caraminguás”.
- Obrigada, escurinho, que Deus lhe pague! – disse a
velha pedinte com cara de quem achou pouco e depois falou alto para a senhora bem
vestida, cuja vestimenta combinava com a cútis, extremamente branca, e que se
preparava para dar partida no seu SUV importado:
- Está vendo, branquela granfina, ali vai um
preto de alma branca!
Olhei
indignado para a velha mendiga, para a ricaça e para o afrodescendente que deu
um sorriso amarelo e, foi o Graxaim que interrompeu o que eu ia começar a
falar:
- Pronto seu Lê, tá novo; são só cinco
“pratas”!
- Quanto você quer por este gibi? –
perguntei.
- Não é nada não, meu amigo, pode levar
prôce! Ele é muito velho e não vale nada!
- Vale sim, meu amigo, tome sessenta
“pratas” pelo serviço e o gibi!
- Obrigado seu Lê! Não falei que hoje
eu teria sorte?
Os
rabanetes, a poça d`água, o engraxate, a ricaça, a mendiga, o afrodescendente e
a coincidência de encontrar o gibi do Tarzan número dezessete de novembro de
1.952, que eu procurava há cinquenta anos, e a engraxada de sessenta “pratas”
do Graxaim:
- É - enchendo o peito de ar falei - meu amigo Graxaim, sorte mesmo! Nossa
sorte!
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