sexta-feira, 5 de julho de 2013

VIDA EM VIRTUÁLIA - CAFOFO "CHIQUE"

ARRET
A NOVA MORADA
CAFOFO “CHIQUE”
            No caminho para a sede do sítio:
            - O que o senhor faz aqui perto do portal tão cedo, “Véi”?
           - Ieu vim atrais du meu pangaré. Vô lá  im Virtuáia comprá fumu di rolu i uns treim qui a Xerê mi pidiu.
            - E por falar na Xerê? Como estão ela e a Ritinha?
            - Ielas tão boa, meu amigu. Inda onti nóis falamu im ocê!
            - É mesmo Nhô? Sobre o quê?
            - É qui nu dia trinta i um úrtimu, ieu sonhei qui ocê tinha vindu vivê cum nóis di veis nesti mundim di Virtuáia.
            - Interessante Nhô, parece que eu estou num sonho e não posso acordar. É como só existisse este mundo e que nunca houve outro.
            - Ocê tá vinu di Arret num é, Misifiu?
            - Você viu o portal clareando de novo e veio ver quem era não é? Por isso sabe que vim de lá?
            - Du seu irreá mundu normá é qui ocê num vêi. Pruque a Vermeiona ainda tá guardada nu garpão i ôce só vem di lá néia – respondeu o Nhô.
            - Nhô, nesse tempo todo,  que passei fora, estive com os arretianos em Arret, Terra II e outro planeta que, agora, é dos reptilianos.
            - É memu , seu Lê? Qui bão qui agora cada quá tem u seu praneta, cada um tem seu mundu, u seu cantim!
            - Pois é “Véi”, eu que já não sei qual é realmente o meu. Vou ficar por aqui uns tempos dando tempo ao tempo!
            - Eh! Eh! Eh! Bunitu trocadíi, Misifiu!
            Na varanda da cozinha da casa do Nhô:
            -Óia seu Lê, vamu prosiá baxim qui as mininas ainda tão druminu. A Ritinha só pregô us zói despois das duas da madrugada!
            - Caramba Nhô, então o senhor não dormiu?
       - Drumi despois das treis, Misifiu. Memu si ieu drumi  fartanu déis minutu pras cincu, às cincu hora ieu já tô dimpé!
            - Esse é o Nhô que eu conheço – brinquei.
          Meia hora de prosa, e de eu tê-lo colocado à par dos acontecimentos das  últimas viagens, o Nhô me perguntou:
         - I u qui oceis fizeru cum u restu du corpu da dotora Kolina?
            - Ele foi incinerado , no incinerador de bordo da nave-mãe , e as cinzas se transformaram em um puríssimo diamante, Nhô.
            - Virô diamanti? Cumu, Misifiu?
            - Num aparelho, que tem na nave-mãe, eles colocaram as cinzas e depois de muito calor e pressão contínua virou uma pedra de carbono puríssimo. O Kobauski a lapidou e a usa em um anel.
            - É muntchu prá minha cabeça véia!  Vamu atrelá u nossu amigu na carroça i í prá cidadi, seu Lê?
            - Vamos sim Nhô. Vou encomendar os materiais pra fazer o meu cantinho. Comprar os móveis e outros utensílios.
            - Ocê vai comprá cama di sortêru ô di casá, seu Lê?
            - Tô pensando, Nhô! Por quê?
           - É pumódi quandu a sua patroinha vinhé ti visitá, oceis drumí juntim, eh! Eh! Eh!
            - Patroinha... patroinha... bem pensado Nhô! O estranho é que eu quero e tento ir até onde ela está e não consigo, “Véi”.
            - Ocê vai acostumá, Misifiu! Pódi tê certeza.
            Aprontamos a carroça e fomos para Virtuália.
            Por quase uma hora, saboreando o trote cadenciado do Bittencourt, quando puxa uma carroça, fomos colocando em dia nossos assuntos:
            - Nhô, o senhor sabe como está o local onde o Juliano, o Beijo e o resto da família dos Flores viviam quando estavam em Virtuália?
            - Sei sim, amigu! Tá du memu jeitu. O Guigugli Tatupeba , aqueie véi rengo i caôio qui u prefeitu Jairu Edsu colocô prá tomá conta du cimintéru, tava moranu lá i cuidava direitim di tudu. Ieli, nessi tempu todu, num tinha abridu nenhuma cova i nem colocadu nenhum mortu im mausolé ninhum, pois num morreu ninguém, linhais, num apareceu nenhum mortu im Virtuáia nus urtimus anus. Ieli era só um tomadô di conta. Comu ieli num tinha nada prá fazê, passava u tempu limpanu us tumulu i a casa adondi us Flô morava.
            - Você falou: -“...qui ieli tava moranu...”-, Nhô?
           - Tava misifiu! Ieli morreu di sustu na última sexta-fêra quaji meia noiti. Ieli saiu correnu du cimintéru gritanu i cum us zóio arregaladu , desdi u campu santu inté pertu du Butecu dus Cardu qui tava chei di genti. Ieli berrava artu:
            - U chupa-cabra! Vi u chupa-cabra – i caiu durim, mortim. Uma rapaziada mai valenti muntaru numa caminhoneti i foru percurá u tar di chupa –cabra.
            - E acharam alguma coisa – perguntei.
            - Nadica di nada! Tão dizenu  qui ieli assustô cum a imagi dêie memu num espêiu, quandu acordô dum pesadelu. A porta du guarda-rôpa, du quartu ondi ieli durmia – quartu du Julianu -, que tem um espêiu drentu, tava aberta.
            - Ah! Ah! Ah! Seria engraçado se não fosse tão trágico!
            - Coitadu du Tatupeba, ieli era um bão chujeitu, mai bibia muntchu. Disqui ieli tava bebenu uns litru di árcu di postu, aquêie di ponhá im carru, pur dia:
            - Cruzes, Nhô! Coitado!
            - Foi u Paulim, u Lezivu i u Biliatu qui abriru a cova deie nu cimintéru.
            - Por falar em cemitério, vamos passar lá para ver como está a habitação da família Flores, Nhô?  O Juliano, Beijo e os outros familiares dele estão querendo voltar para Virtuália.
            - É memu, Misifiu? Vamu lá intão!

            No cemitério:
            - É Nhô, o Tatupeba até que cuidou direito de tudo por aqui.
            - É memu, tá quaji iguá inhantis dus Flô í prô ispaçu, eh! Eh! Eh!
            - E a Variant do Juliano, ainda está guardada no  seu sítio, Nhô?
            - Tá sim, seu Lê! Tá naqueie puxadim atrais du currá das cabra. Iela tá cuberta cum lona encerada. Tá du jeitim qui ieli dexô.
            - Ótimo “Véi”! Despois vamos dar umas voltas com ela por Virtuália.
            - Ocê qui sabi seu Lê. Mai nu dia qui eis vortá nóis fais um mutirão di limpeza im todu u locá du cimintériu. Farta pôcu, num é memu?
            - É mesmo, você tirou essa ideia de minha cabeça, Nhô! Vamos até a prefeitura e acertar com o prefeito a volta deles para morar e continuar a serem funcionários públicos da prefeitura, OK?
            - Tá bão, seu Lê, nóis vai conseguir issu pruquê ninguém qué memu trabaiá aqui nu CMV – disse-me o Nhô.
            Na cidade o Nhô foi comprar o que precisava enquanto fui até a prefeitura falar com o Jairo Edson. Foi fácil acertar a volta dos ex-funcionários da prefeitura, visto que, o Juliano havia pedido licença, sem remuneração, para ele e os outros da família Flores. Acertando tudo, peguei as chaves e até consegui aumento de salário para o Beijo, Zé das Flôres e, para as três  filhas dele, arrumei para que fossem contratadas nos cargos de faxineiras e merendeira no Grupo Escolar Bispo-Cardeal. E ficou acertado que o  Juliano voltaria a dar aulas como professor de zoologia.
            Peguei as chaves do cemitério, da casa  e do galpão onde o Juliano  fazia suas fantasias carnavalescas  e o prefeito me propôs:
            - Já que o senhor vai ficar por aqui, seu Lê, eu posso te arrumar um emprego de assessor aqui na prefeitura.
            - Não, obrigado, doutor Jairo! Aposentei-me de uma vez por todas. Agora quero curtir esta nova vida. Vou transformar cada segundo, desta vida, em eternidades. Vou ficar pelo Vale Virtualiano do Rio do Peixe dando tempo ao tempo e de tempos em tempos vou sair por esse universo à fora.
            - Tá certo seu Lê, mas se eu precisar de um bom conselho vou te procurar, OK?
            - Com certeza prefeito, terei prazer em ajudá-lo no que puder!
            Nisto a Cindy interrompe a prosa:
            - Desculpa, mas eu vou estar interrompendo sua reunião prefeito e seu Lê; é que o Nhô está aí na sala de espera e ... – Jairo foi áspero:
            - Não deixe o meu amigo Nhô esperando, Dona Cindy. Mande-o entrar imediatamente!
            - Vou estar mandando ele entrar agora – respondeu a Cindy acostumada com a asperez do Jairo.
            - Bastardi seu Jairu, ocê tá bão?
            - Ótimo Nhô, porém não tão bem como o senhor!
            Nho dirigiu-me  a palavra:
            - Seu Lê, já fiz u qui ieu tinha qui fazê. Vamu armoçá lá nu Pratu Feitchu  ô nu Restô du Gaúchu?
            - Vamos lá no Prato Feito. Faz um bom tempo que não provo o tempero de lá.
            - Nem ieu! Intão vamu i despois nóis vai comprá us seus materiá , tá bão?
            - OK, “Véi” e, depois de comprarmos os meus materiais, vamos ao Boteco dos Caldos falar com nossos amigos.
            No Prato Feito almoçamos frango com quiabo e, estava tão saboroso,  que até o Nhô elogiou. Depois ficamos o resto da tarde por conta de adquirir meus materiais. A loja onde os compramos ficou de entregar tudo depois de amanhã – sexta-feira -, e fomos ao Boteco dos Caldos. Já era  dezessete horas  e trinta e um minutos da tarde quando deixamos o Bittencourt no “estacionamento” de carroças  atrás do boteco:
            - Olha só quem está chegando Biliato! É o seu Lê e o Nhô Antônio Benzedô – gritou Paulino Goró enquanto cuidava dos espetinhos na churrasqueira.
            - Sejam bem vindos, meus amigos – completou o Lezivo e prosseguiu:
            - Seu Lê, estamos fazendo uma vaca atolada com carne seca daquelas que os anjos e arcanjos comem ajoelhados, ah! Ah! Ah!
            - Estão usando a receita do Nhô – perguntei.
            - Sempre, seu Lê – disse o Biliato.
            - Então vai ficar ótima – respondi-lhe
            Depois de degustarmos duas porções da iguaria cada um de nós, e expor a empreitada da construção do meu cafofo, o Paulinho – mais animados dos animados -, disse:
        - Vamos fazer sua suíte neste próximo fim de semana. Começamos sábado de manhã e domingo à tarde vai estar pronta. Não é pessoal?
            - É isso aí! – responderam em côro.
           - Obrigado amigos – agradeci emocionado, despedimo-nos e voltamos para o sítio.
          No sábado, às cinco horas de um alvorecer agradável, Nhô e eu terminávamos o desejum:
            - Seu Lê, inquantu oceis trabaiam na construção, ieu vô perparanu uma fejoada muntchu da caprichada; vai tê di tudu néia. Vou fazê arrois branquim, côve, laranja, abacaxi i caipirinha di limão galegu. Já deixei desdi onti as carni di môio. Vô começá agora i lá pelu mêi dia vai tá nu pontu, eh! Eh! Eh!
        - Ótimo Nhô! Fazendo esse quarto, fora da sua casa, ninguém atrapalhara a privacidade de ninguém, não é?
            - Ocê é qui manda, Misifiu, eh! Eh! Eh!
            - Tô ovinu baruiu di carru vinu lá du ladu di Virtuáia, seu Lê! Dédi sê u pessoa prá empeleitada! Inda bem qui ieu perparei café prum bataião, eh! Eh! Eh!
           E era o pessoal mesmo, ou seja: Paulinho, Lezivo, Biliato, Cabo Tião e dois soldados - que estavam de folga -, e  o seu Moreira o melhor mestre de obras de todo o Vale com dois pedreiros amigos seus.
           Pararam os carros perto do galpão principal do sítio e foi o Paulinho quem gritou:
          - Bom dia, pessoal! Vejo que a Casa do Construtor entregou todo o material!
       - Bom dia minha gente! Entregaram sim Paulinho, não faltou nada!
         Após tomarem café pegaram com a ferocidade leonina no trabalho distribuído pelo seu Moreira. O Lezivo determinou:
         - Seu Lê, o senhor pode ir ajudando o Nhô na feijoada e deixe o resto por nossa conta. O desenho que o senhor fez da suíte é fácil de seguir e vai ser um imóvel prático e funcional.
         A muito contragosto fui obrigado a seguir a determinação do Lezivo, porem, além de ajudar o Nhô, eu também levava refresco para o pessoal.
           Ao meio dia, todas as paredes estavam levantadas, o piso pronto, vaso, pia, banheira de hidromassagem e chuveiro no lugar; na verdade faltava terminar menos da metade do telhado, rebocar e pintar. Exatamente ao meio dia e trinta e um minutos o Nhô gritou:
            - Tá prontu a fejoada rapaziada!
            O aroma era digno dos deuses da culinária e a festa foi geral. Só  quem não bebericou da caipirinha foram o Goró e o seu Moreira.
            Descansamos até as quatorze e trinta e um minutos e por volta das dezoito e trinta e um minutos, o cafofo estava pronto, ou seja, quarto, sala e banheiro espaçosos.
            - Eh! Eh! Eh! Taí u seu cafofo, seu Lê! Só farta pintar, mai premêro us rebocu das paredi tem qui secá – disse o Nhô.
            - Seu Lê, sábado que vem nos pintaremos para o senhor – disse o Lezivo.
            - Eu agradeço muito meus amigos, mas eu mesmo pintarei na próxima segunda-feira. Até lá deverá estar tudo seco, não é seu Moreira – perguntei ao mestre de obras.
            - Com certeza! De manhã o senhor dá uma demão e à tarde uma segunda e última demão – orientou-me o mestre.
            - Ieu ajudu ocê, Misifiu! Pintá é fáci – prontificou-se o Nhô e continuou:
            - Tá prontu u lanchi proceis cumê inhantes di vortá pra Virtuáia. Tem torresmu, joeiu di java-porcu i ainda refrescu di abacaxi i caipirinha di limão capeta; quem quizé tem purinha tamém.

          Todos se fartaram antes de seguirem, na Veraneio modelo “Marta Rocha” ano sessenta e quatro, pilotada pelo sóbrio Moreira e na Vaneide sul-coreana do Goró, para Virtuália após a demorada despedida de um por um.
           - Parece mentira Nhô, mas conseguimos!
          - Eh! Eh! Eh! A união fais a força i consegui inté dirrubá guvernu corruptu, Misifiu!
            - Tem razão mais uma vez, Nhô!
           - Ieu vô vê si a Xerê percisa di arguma coisa. Ocê pódi ficá à vontadi qui a casa é sua, seu Lê!
            - Na verdade eu me sinto é no paraíso cercado de anjos, meu amigo!
            - Eh! Eh! Eh! Num izagera Misifiu, num izagera! Paraisu i infernu, diveras é u istadu qui u ispritu si senti.
          - Falou tudo “Véi”! Vou subir lá para o meu cafofo e adiantar a limpeza. Boa noite Nhô!
            - Intão tá intão, banoiti i intémanhã!


Continua dia 12/07/2013 em:
PERTURBAÇÕES
  NO PORTAL DAS

 PITANGUEIRAS

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