ARRET
A NOVA
MORADA
CAFOFO “CHIQUE”
No
caminho para a sede do sítio:
- O que o senhor faz aqui perto do portal
tão cedo, “Véi”?
- Ieu vim atrais du meu pangaré. Vô
lá im Virtuáia comprá fumu di rolu i uns
treim qui a Xerê mi pidiu.
- E por falar na Xerê? Como estão
ela e a Ritinha?
- Ielas tão boa, meu amigu. Inda
onti nóis falamu im ocê!
- É mesmo Nhô? Sobre o quê?
- É qui nu dia trinta i um úrtimu,
ieu sonhei qui ocê tinha vindu vivê cum nóis di veis nesti mundim di Virtuáia.
- Interessante Nhô, parece que eu
estou num sonho e não posso acordar. É como só existisse este mundo e que nunca
houve outro.
- Ocê tá vinu di Arret num é,
Misifiu?
- Você viu o portal clareando de
novo e veio ver quem era não é? Por isso sabe que vim de lá?
- Du seu irreá mundu normá é qui ocê
num vêi. Pruque a Vermeiona ainda tá guardada nu garpão i ôce só vem di lá néia
– respondeu o Nhô.
- Nhô, nesse tempo todo, que passei fora, estive com os arretianos em
Arret, Terra II e outro planeta que, agora, é dos reptilianos.
- É memu , seu Lê? Qui bão qui agora
cada quá tem u seu praneta, cada um tem seu mundu, u seu cantim!
- Pois é “Véi”, eu que já não sei
qual é realmente o meu. Vou ficar por aqui uns tempos dando tempo ao tempo!
- Eh! Eh! Eh! Bunitu trocadíi,
Misifiu!
Na
varanda da cozinha da casa do Nhô:
-Óia seu Lê, vamu prosiá baxim qui as
mininas ainda tão druminu. A Ritinha só pregô us zói despois das duas da
madrugada!
- Caramba Nhô, então o senhor não
dormiu?
- Drumi despois das treis, Misifiu.
Memu si ieu drumi fartanu déis minutu
pras cincu, às cincu hora ieu já tô dimpé!
- Esse é o Nhô que eu conheço – brinquei.
Meia
hora de prosa, e de eu tê-lo colocado à par dos acontecimentos das últimas viagens, o Nhô me perguntou:
- I u qui oceis fizeru cum u restu du corpu
da dotora Kolina?
- Ele foi incinerado , no
incinerador de bordo da nave-mãe , e as cinzas se transformaram em um puríssimo
diamante, Nhô.
- Virô diamanti? Cumu, Misifiu?
- Num aparelho, que tem na nave-mãe,
eles colocaram as cinzas e depois de muito calor e pressão contínua virou uma
pedra de carbono puríssimo. O Kobauski a lapidou e a usa em um anel.
- É muntchu prá minha cabeça véia! Vamu atrelá u nossu amigu na
carroça i í prá cidadi, seu Lê?
- Vamos sim Nhô. Vou encomendar os materiais pra fazer o meu cantinho. Comprar os móveis e outros utensílios.
- Ocê vai comprá cama di sortêru ô
di casá, seu Lê?
- Tô pensando, Nhô! Por quê?
- É pumódi quandu a sua patroinha
vinhé ti visitá, oceis drumí juntim, eh! Eh! Eh!
- Patroinha... patroinha... bem
pensado Nhô! O estranho é que eu quero e tento ir até onde ela está e não
consigo, “Véi”.
- Ocê vai acostumá, Misifiu! Pódi tê
certeza.
Aprontamos
a carroça e fomos para Virtuália.
Por
quase uma hora, saboreando o trote cadenciado do Bittencourt, quando puxa uma
carroça, fomos colocando em dia nossos assuntos:
- Nhô, o senhor sabe como está o local onde
o Juliano, o Beijo e o resto da família dos Flores viviam quando estavam em
Virtuália?
- Sei sim, amigu! Tá du memu jeitu.
O Guigugli Tatupeba , aqueie véi rengo i caôio qui u prefeitu Jairu Edsu colocô
prá tomá conta du cimintéru, tava moranu lá i cuidava direitim di tudu. Ieli,
nessi tempu todu, num tinha abridu nenhuma cova i nem colocadu nenhum mortu im
mausolé ninhum, pois num morreu ninguém, linhais, num apareceu nenhum mortu im
Virtuáia nus urtimus anus. Ieli era só um tomadô di conta. Comu ieli num tinha
nada prá fazê, passava u tempu limpanu us tumulu i a casa adondi us Flô
morava.
- Você falou: -“...qui ieli tava
moranu...”-, Nhô?
- Tava misifiu! Ieli morreu di sustu
na última sexta-fêra quaji meia noiti. Ieli saiu correnu du cimintéru gritanu i
cum us zóio arregaladu , desdi u campu santu inté pertu du Butecu dus Cardu qui
tava chei di genti. Ieli berrava artu:
- U chupa-cabra! Vi u chupa-cabra – i caiu durim, mortim. Uma rapaziada mai valenti
muntaru numa caminhoneti i foru percurá u tar di chupa –cabra.
- E acharam alguma coisa – perguntei.
- Nadica di nada! Tão dizenu qui ieli assustô cum a imagi dêie memu num espêiu,
quandu acordô dum pesadelu. A porta du guarda-rôpa, du quartu ondi ieli durmia
– quartu du Julianu -, que tem um espêiu drentu, tava aberta.
- Ah! Ah! Ah! Seria engraçado se não
fosse tão trágico!
- Coitadu du Tatupeba, ieli era um
bão chujeitu, mai bibia muntchu. Disqui ieli tava bebenu uns litru di árcu di
postu, aquêie di ponhá im carru, pur dia:
- Cruzes, Nhô! Coitado!
- Foi u Paulim, u Lezivu i u Biliatu
qui abriru a cova deie nu cimintéru.
- Por falar em cemitério, vamos
passar lá para ver como está a habitação da família Flores, Nhô? O Juliano, Beijo e os outros familiares dele
estão querendo voltar para Virtuália.
- É memu, Misifiu? Vamu lá intão!
No
cemitério:
- É Nhô, o Tatupeba até que cuidou direito
de tudo por aqui.
- É memu, tá quaji iguá inhantis
dus Flô í prô ispaçu, eh! Eh! Eh!
- E a Variant do Juliano, ainda está
guardada no seu sítio, Nhô?
- Tá sim, seu Lê! Tá naqueie puxadim
atrais du currá das cabra. Iela tá cuberta cum lona encerada. Tá du jeitim qui
ieli dexô.
- Ótimo “Véi”! Despois vamos dar
umas voltas com ela por Virtuália.
- Ocê qui sabi seu Lê. Mai nu dia
qui eis vortá nóis fais um mutirão di limpeza im todu u locá du cimintériu.
Farta pôcu, num é memu?
- É mesmo, você tirou essa ideia de
minha cabeça, Nhô! Vamos até a prefeitura e acertar com o prefeito a volta
deles para morar e continuar a serem funcionários públicos da prefeitura, OK?
- Tá bão, seu Lê, nóis vai conseguir
issu pruquê ninguém qué memu trabaiá aqui nu CMV – disse-me o
Nhô.
Na
cidade o Nhô foi comprar o que precisava enquanto fui até a prefeitura falar
com o Jairo Edson. Foi fácil acertar a volta dos ex-funcionários da prefeitura,
visto que, o Juliano havia pedido licença, sem remuneração, para ele e os
outros da família Flores. Acertando tudo, peguei as chaves e até consegui aumento
de salário para o Beijo, Zé das Flôres e, para as três filhas dele, arrumei para que fossem
contratadas nos cargos de faxineiras e merendeira no Grupo Escolar
Bispo-Cardeal. E ficou acertado que o Juliano voltaria a dar aulas como professor de zoologia.
Peguei
as chaves do cemitério, da casa e do
galpão onde o Juliano fazia suas fantasias carnavalescas e o prefeito me propôs:
- Já que o senhor vai ficar por aqui, seu
Lê, eu posso te arrumar um emprego de assessor aqui na prefeitura.
- Não, obrigado, doutor Jairo!
Aposentei-me de uma vez por todas. Agora quero curtir esta nova vida. Vou
transformar cada segundo, desta vida, em eternidades. Vou ficar pelo Vale
Virtualiano do Rio do Peixe dando tempo ao tempo e de tempos em tempos vou sair
por esse universo à fora.
- Tá certo seu Lê, mas se eu
precisar de um bom conselho vou te procurar, OK?
- Com certeza prefeito, terei prazer
em ajudá-lo no que puder!
Nisto
a Cindy interrompe a prosa:
- Desculpa, mas eu vou estar interrompendo
sua reunião prefeito e seu Lê; é que o Nhô está aí na sala de espera e ... –
Jairo foi áspero:
- Não deixe o meu amigo Nhô esperando, Dona
Cindy. Mande-o entrar imediatamente!
- Vou estar mandando ele entrar
agora – respondeu a Cindy acostumada com a asperez do Jairo.
- Bastardi seu Jairu, ocê tá bão?
- Ótimo Nhô, porém não tão bem como
o senhor!
Nho
dirigiu-me a palavra:
- Seu Lê, já fiz u qui ieu tinha qui fazê.
Vamu armoçá lá nu Pratu Feitchu ô nu
Restô du Gaúchu?
- Vamos lá no Prato Feito. Faz um
bom tempo que não provo o tempero de lá.
- Nem ieu! Intão vamu i despois nóis
vai comprá us seus materiá , tá bão?
- OK, “Véi” e, depois de comprarmos
os meus materiais, vamos ao Boteco dos Caldos falar com nossos amigos.
No
Prato Feito almoçamos frango com quiabo e, estava tão saboroso, que até o Nhô elogiou. Depois ficamos o resto
da tarde por conta de adquirir meus materiais. A loja onde os compramos ficou
de entregar tudo depois de amanhã – sexta-feira -, e fomos ao Boteco dos
Caldos. Já era dezessete horas e
trinta e um minutos da tarde quando deixamos o Bittencourt no “estacionamento”
de carroças atrás do boteco:
- Olha só quem está chegando Biliato! É o
seu Lê e o Nhô Antônio Benzedô – gritou Paulino Goró enquanto cuidava dos
espetinhos na churrasqueira.
- Sejam bem vindos, meus amigos –
completou o Lezivo e prosseguiu:
- Seu Lê, estamos fazendo uma vaca atolada
com carne seca daquelas que os anjos e arcanjos comem ajoelhados, ah! Ah! Ah!
- Estão usando a receita do Nhô – perguntei.
- Sempre, seu Lê – disse o Biliato.
- Então vai ficar ótima – respondi-lhe
Depois
de degustarmos duas porções da iguaria cada um de nós, e expor a empreitada da
construção do meu cafofo, o Paulinho – mais animados dos animados -, disse:
- Vamos fazer sua suíte neste próximo fim de
semana. Começamos sábado de manhã e domingo à tarde vai estar pronta. Não é
pessoal?
- É isso aí! – responderam
em côro.
- Obrigado amigos – agradeci emocionado,
despedimo-nos e voltamos para o sítio.
No
sábado, às cinco horas de um alvorecer agradável, Nhô e eu
terminávamos o desejum:
- Seu Lê, inquantu oceis trabaiam na
construção, ieu vô perparanu uma fejoada muntchu da caprichada; vai tê di tudu
néia. Vou fazê arrois branquim, côve, laranja, abacaxi i caipirinha di limão
galegu. Já deixei desdi onti as carni di môio. Vô começá agora i lá pelu mêi
dia vai tá nu pontu, eh! Eh! Eh!
- Ótimo Nhô! Fazendo esse quarto,
fora da sua casa, ninguém atrapalhara a privacidade de ninguém, não é?
- Ocê é qui manda, Misifiu, eh! Eh!
Eh!
- Tô ovinu baruiu di carru vinu lá
du ladu di Virtuáia, seu Lê! Dédi sê u pessoa prá empeleitada! Inda bem qui ieu
perparei café prum bataião, eh! Eh! Eh!
E era
o pessoal mesmo, ou seja: Paulinho, Lezivo, Biliato, Cabo Tião e dois soldados
- que estavam de folga -, e o seu
Moreira o melhor mestre de obras de todo o Vale com dois pedreiros amigos seus.
Pararam
os carros perto do galpão principal do sítio e foi o Paulinho quem gritou:
- Bom dia, pessoal! Vejo que a Casa do Construtor
entregou todo o material!
- Bom dia minha gente! Entregaram
sim Paulinho, não faltou nada!
Após
tomarem café pegaram com a ferocidade leonina no trabalho distribuído pelo seu
Moreira. O Lezivo determinou:
- Seu Lê, o senhor pode ir ajudando o Nhô na
feijoada e deixe o resto por nossa conta. O desenho que o senhor fez da suíte é
fácil de seguir e vai ser um imóvel prático e funcional.
A
muito contragosto fui obrigado a seguir a determinação do Lezivo, porem, além
de ajudar o Nhô, eu também levava refresco para o pessoal.
Ao
meio dia, todas as paredes estavam levantadas, o piso pronto, vaso, pia,
banheira de hidromassagem e chuveiro no lugar; na verdade faltava terminar
menos da metade do telhado, rebocar e pintar. Exatamente ao meio dia e trinta e
um minutos o Nhô gritou:
- Tá prontu a fejoada rapaziada!
O
aroma era digno dos deuses da culinária e a festa foi geral. Só quem não bebericou da caipirinha foram o Goró
e o seu Moreira.
Descansamos
até as quatorze e trinta e um minutos e por volta das dezoito e trinta e um minutos,
o cafofo estava pronto, ou seja, quarto, sala e banheiro espaçosos.
- Eh! Eh! Eh! Taí u seu cafofo, seu Lê! Só
farta pintar, mai premêro us rebocu das paredi tem qui secá – disse o Nhô.
- Seu Lê, sábado que vem nos pintaremos para
o senhor – disse o Lezivo.
- Eu agradeço muito meus amigos, mas eu
mesmo pintarei na próxima segunda-feira. Até lá deverá estar tudo seco, não é
seu Moreira – perguntei ao mestre de obras.
- Com certeza! De manhã o senhor dá uma
demão e à tarde uma segunda e última demão – orientou-me o mestre.
- Ieu ajudu ocê, Misifiu! Pintá é fáci –
prontificou-se o Nhô e continuou:
- Tá prontu u lanchi proceis cumê inhantes
di vortá pra Virtuáia. Tem torresmu, joeiu di java-porcu i ainda refrescu di
abacaxi i caipirinha di limão capeta; quem quizé tem purinha tamém.
Todos
se fartaram antes de seguirem, na Veraneio modelo “Marta Rocha” ano sessenta e
quatro, pilotada pelo sóbrio Moreira e na Vaneide sul-coreana do Goró, para
Virtuália após a demorada despedida de um por um.
- Parece mentira Nhô, mas conseguimos!
- Eh! Eh! Eh! A união fais a força i
consegui inté dirrubá guvernu corruptu, Misifiu!
- Tem razão mais uma vez, Nhô!
- Ieu vô vê si a Xerê percisa di arguma
coisa. Ocê pódi ficá à vontadi qui a casa é sua, seu Lê!
- Na verdade eu me sinto é no
paraíso cercado de anjos, meu amigo!
- Eh! Eh! Eh! Num izagera Misifiu,
num izagera! Paraisu i infernu, diveras é u istadu qui u ispritu si senti.
- Falou tudo “Véi”! Vou subir lá
para o meu cafofo e adiantar a limpeza. Boa noite Nhô!
- Intão tá intão, banoiti i intémanhã!
Continua dia 12/07/2013 em:
PERTURBAÇÕES
NO PORTAL DAS
PITANGUEIRAS
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