ARRET
A NOVA
MORADA
O Teco - Teco
Tudo
estava tranquilo às dezoito horas e trinta e um minutos daquela sexta-feira.
Nem parecia ter passado os quase, três meses de minha estadia na fazenda do
Nilton Júnior.
Eu
estava no varandão da frente do escritório/residência no meu habitual laser
quando:
- Seu Lê, confirmamos a fertilização da
centésima trigésima primeira vaca Nelore PO. Nosso aproveitamento é de quase
oitenta por cento – disse-me Ribamar, o excelente técnico agrícola e expert em
inseminação artificial.
Larguei
a revista-em-quadrinhos – o popular gibi -, d’Os Sobrinhos do Coronel que
estava lendo e disse:
- Que ótimo Riba! Se continuarmos assim em
três anos este rebanho vai estar enorme e de primeira qualidade!
- Estamos alcançando nossos
objetivos estudados seu Lê – falou o maranhense e me perguntou:
-Seu Lê, esses gibis que o senhor está lendo
são das personagens Max Lott e d’Os Sobrinhos do Coronel?
- São sim Riba! Eu tenho uma coleção
de quase cinco mil gibis diversos lá na minha casa em Minas Gerais. Porém, tenho
só os trinta e um últimos números da coleção do Max Lott; a coleção raríssima
desse “herói” vai até o número cento e oitenta e quatro. A d’Os Sobrinhos me
faltam mais de cento e trinta e um dos quatrocentos e oitenta e quatro números
publicados.
- Que coincidência, seu Lê, o meu
tio, que tem mais de setenta anos de idade, possui essas duas coleções
completas e várias outras, inclusive: almanaques anuais, almanaques de férias
escolares, edições especiais e as edições extras! Ele quer vender tudo mas,
só vende o lote todo. Se o senhor quiser eu...
- Quero! Claro que quero – falei
afoito e perguntei:
- Onde ele mora Riba?
- Em Carutapera, no Maranhão. Ele
quer trocar de carro e precisa vender para completar o valor do veículo dos
sonhos dele. Se o senhor quiser eu telefono para ele e marcamos de nos
encontrar lá na cidadezinha dele.
- Vamos fazer melhor! Você liga para
ele, me apresenta e eu trato direto com ele, ok?
- OK, seu Lê eu ligo e...
- Ligue agora do telefone aqui da
sede! – disse-lhe.
Depois
de trinta e um minutos conversando com o Raimundo – tio do Ribamar -, desliguei
o telefone e:
- Pronto Riba, já tratei de tudo. Vamos para
Soure agora e dormir lá. Amanhã cedo vamos para Carutapera. Comprei todos os
gibis do seu tio! Vamos lá pagar e pegar as coleções. De Soure até lá nós vamos
no Teco-teco da fazenda; de lá vamos para Belém. Na capital vou ficar até
segunda-feira para resolver assuntos junto a Secretaria da Fazenda Estadual e
aproveitarei para despachar os gibis para Juiz de Fora através de uma
transportadora terrestre. E, se você quiser , pode ficar lá em Carutapera ou em
Belém já que você está aqui na fazenda há três meses direto – falei
entusiasmado.
- Ótimo seu Lê, eu precisava mesmo ir lá ao
Maranhão e... – interrompi o Riba:
- Você pode retornar no outro fim de semana.
Depois, que você retornar, vou dar ao Jeremias uma semana de folga também, OK?
- OK! O Jerê vai ficar super
contente. Ele vai aproveitar e trazer a mulher dele para morar aqui também!
- Ele está certo, não é bom ficar
longe da esposa quando são recém-casados. A mulher dele ainda trabalha como
técnica em laticínios – perguntei-lhe.
- Ela estava trabalhando numa indústria de
derivados do leite lá em Lagoa da Prata em Minas mas, fez um acerto rescisório
com a empresa para poder vir para cá!
- É muita coincidência Riba; mas
muita mesmo!
- Por que seu Lê?
- O Juninho aceitou meu conselho e
vamos aumentar, aliás, triplicar nosso rebanho de búfalos e em três meses vamos
industrializar leite bubalino na fabricação de muçarela e outros
produtos. Vamos precisar de uma técnica em laticínios. É ou não é uma
coincidência?
- Caramba! É tudo de bom para todos
nós. Posso falar com o Jerê?
- Faça melhor, chame-o aqui para
conversarmos enquanto nós jantamos. Vamos tratar de tudo, ou seja, salário de
uma técnica que vem de Minas para o Marajó, residência, plano de saúde... tudo
o que é de direito e lei, OK?
- OK! OK! Seu Lê – respondeu
o Ribamar felicíssimo pelo amigo.
E
assim foi feito.
Sábado,
dez e trinta e um minutos descemos numa rudimentar pista de pouso em uma fazenda perto de
Carutapera, ao norte do Maranhão:
- Seu Lê, o senhor é um excelente piloto – disse
o Riba.
- Pilotar esse avião pequeno não é difícil,
Riba, é só questão de prática!
- Olha lá está o meu tio nos
esperando. Ele veio na Chevrolet Veraneio dele – disse o
sobrinho apontando para um senhor que estava ao lado de um velho e surrado
veículo verde limão.
Após
as apresentações, nós fomos até a residência do Raimundo Nonato e ele propôs,
aliás, exigiu:
- Vocês vão almoçar comigo! Vou fazer peixe com
molho de camarão graúdo de nossa região costeira. Não aceito desculpas!
Eu
estava agoniado para ver as coleções de gibis até que, depois de uma rodada de
cervejas geladas e mandioca com carne de sol – como tira gosto enquanto esperávamos o almoço-, Raimundo me
chamou para uma varanda lateral, onde guardava o carro, e me disse:
- As coleções estão nessas quatro caixas
grandes de papelão, seu Lê! Pode verificar uma por uma se quiser.
Abri
a primeira caixa da fila e meus olhos marejaram, pois ali estava, na minha
frente, parte de um sonho meu. Peguei
nas mãos o primeiro número do gibi do Max Lott. O estado de conservação era
espetacular apesar de já ter mais de sessenta e cinco anos de publicado.
O
convite da família do Raimundo me fez ficar na fazenda até domingo à tarde
quando nos despedimos e eu, deixando o Riba com os tios, rumei para Belém.
Durante
o voo:
- Todos os meus sonhos materiais se
concretizam. Quando é que eu ia imaginar que conseguiria essas coleções no
interior do Maranhão? E o que é mais espetacular é estando eu na Ilha do
Marajó!
Segunda-feira,
por volta das catorze horas e trinta e um minutos, após ter mandado minhas
caixas com as coleções para Minas Gerais, por uma transportadora terrestre e
resolvida a pendência junto ao órgão fazendário do estado do Pará, telefonado
para a Rô, levantei voo para voltar para Soure:
- Eita vida boa, sô! Ih caramba, falei
trinta e um minutos com a patroinha, ao telefone, e não falei dos gibis que eu
mandei para casa. Ainda bem que coloquei um bilhete para ela numa das caixas.
- A semana que vem o Juninho estará
de volta e ele vai encontrar tudo funcionando organizadamente e, o projeto dos
queijos de leite de búfala, em andamento. Vou ficar por dois meses quieto em
casa junto da Rô, do Max Lott, dos meus netos e d’Os Sobrinhos do Coronel.
Alguns minutos depois:
- Lá está o campo de aviação de Soure, mas vou precisar de cuidado para aterrizar, pois, tem muitos urubus rodeando alguma
carniça perto da cabeceira da pista- falei isso e comecei a preparar o
teco-teco para o pouso e um barulho enorme, de algo se chocando com o aviãozinho, fez com que eu perdesse o controle da aeronave e esta foi de encontro à copa de
uma castanheira e perdi os sentidos.
...
- Seu Lê! Seu Lê, u sinhô tá bem? U qui ôvi
, misifiu?
- Eu... eu... perdi o controle da
GMC após bater em alguma coisa que atravessou a pista, Nhô!
- Ôce si machucô- preocupado
perguntou o meu amigo e observou:
- Óia só quem evem cheganu! É u Paulin Goró
cum a Vaneidi!
Os
meus sentidos foram apagando aos poucos e só deu para ouvir o Nhô falando ao
Paulo di Paulli:
- Vamu levá ieli nu HU da Universidadi
Siderá di Virtuáia na Vaneidi!
- Vamos sim Nhô e rápido, porque ele está desmaiando!
- Vamos sim Nhô e rápido, porque ele está desmaiando!
...
Na
cabeceira da pista do campo de aviação de Soure:
- Rápido minha gente, nós temos que tirar o
piloto de lá! O avião vai despencar do alto da castanheira e, se ele não
morreu, vai morrer – gritava um dos funcionários do local.
- Eu... estou... vivo mas não consigo me
mexer do pescoço para baixo – eu gritava com a pouca força que ainda
restava.
- Calma moço, vamos tirá-lo daí e levá-lo
para o melhor hospital de Belém em um taxi aéreo que deixou turistas alemães
aqui no arquipélago – disse o piloto da empresa de taxi aéreo.
- Esse teco-teco pertence às empresas do
senhor Nilton Bezerra. Podem levá-lo que
o Juninho pagará todas as despesas – disse o responsável pelo arcaico
aeroporto.
Dentro
do outro avião, indo para Belém, eu continuava a não sentir o resto do corpo:
- Eu... eu... não estou conseguindo respirar...
minha cabeça dói muito... acho que vou desmaiar...
...
No HU
da USV recuperei os sentidos e perto de mim estava o Dr. José Walter que falou:
- Não foi nada seu Lê! Apenas uma queda de
pressão devido ao susto. O senhor pode ir para o sítio do Nhô, se quiser.
- Eu levo o senhor na Vaneide, seu
Lê – ofereceu-se o Paulino que estava comigo desde que
desmaiei e perguntei-lhe:
-Por quanto tempo fiquei desacordado Goró?
- Só Trinta e um minutos seu Lê –
respondeu-me e continuou a falar:
- O Nhô falou que não era nada, mas que era
bom tirar umas radiografias para ver se tinha quebrado alguma costela. Ele
disse que tinha certeza que o senhor não se machucara gravemente.
- Cadê ele?
- Ele tinha tanta certeza que o senhor
estava bem que preferiu ficar no sítio destrinchando a capivara que bateu na
GMC do senhor. Vou levar o senhor de volta ao sítio e trazer a minha parte do
bicho. A capivara pesava quase oitenta quilos, seu Lê.
- Caramba! Então deve ter acabado
com minha vermelhona?
- Só amassou um pouco o para-choque
e o para-lama. Foi mais barulho e susto.
- Podemos ir para o sítio, seu Lê –
perguntou-me o Paulinho.
- Sim, vamos agora! Dr. José Walter, muito
obrigado por tudo, OK?
- Tudo bem, pode ir! Vou avisar ao
reitor Oscar que o senhor já está indo para o sítio do Nhô. Falarei que está
ótimo. Ele não pode vir pois esta em uma reunião com o prefeito Jairo
Edson.
- OK! Então vamos Goró!
Chegando
ao sítio vi que a GMC estava dentro do galpão e corri até ela. O Nhô me viu e
disse:
- Eh! Eh! Eh! Correndu ansim dá prá vê qui
ôce tá bom, seu Lê! Ieu to muntchu contenti!
- Eu estou melhor que antes “Véi”!
Olhei
a vermelhona e constatei que não fora nada sério e perguntei:
- Quem a colocou no galpão, Nhô?
- Ieu, seu Lê! Esti pretu véi num é
tão Bittencourt ansim, eh! Eh! Eh! Ôce si isqueceu qui ieu já dirigi inté caminhão
Reo di gasogênio – incrível, mas o pangaré ouvindo seu nome, pois
pastava ali perto, deu um longo relincho que parecia entender a ofensa.
- Seu Lê, ieu tô perparanu um churrascu di
uma banda di capivara. A ôtra u Goró...- Nhô foi interrompido pelo
Paulinho:
- Nhô e seu Lê, já coloquei a outra banda do
bicho na minha minivan sul-coreana – a Vaneide -, já vou para o Boteco dos
Caldos. Hoje teremos churrasquinhos exóticos.
- Ah! Ah! Ah! Então Vaneide não é
nenhuma mulher? Pensei que a Cindy estava sendo traída, ah! Ah! Ah!
- Isso não vai acontecer nunca, seu
Lê, eh! Eh! Eh! – gargalhou o Goró.
Fiquei
na tranquilidade do sítio até o décimo terceiro dia da última visita dos
arretianos. Pouco antes do horário combinado, eu já estava próximo ao portal
com todos os sentidos apurados. De repente, do nada, mas absolutamente nada, na
escuridão do céu coberto de nuvens pesadas e sem luar tudo começou. Entre as
duas pitangueiras – distantes cento e trinta e um metros entre si -, um pequeno
foco luminoso começou a surgir, e em questão de trinta e um segundos, o portal
estava aberto o suficiente para o Kobauski atravessar e me dizer:
- Venha seu Lê, entremos e partamos! Nem desaceleramos o sistema
de navegação da nave-mãe.
- OK! Comandante, vamos nessa!
Continua no dia 21/06/2013 em:
ARRET
A NOVA
MORADA
O coágulo
Para entender este texto tu tens que ir lá no início dos textos. Com o passar da leitura dos primeiros textos é que irás entender -
ResponderExcluircronologicamente -,este e os outros, até o final, ok?
Se quiseres contatos eis meu e-mail:
lecinof@gmail.com