sexta-feira, 29 de março de 2013

VIDA EM VIRTUÁLIA


ARRET

A NOVA MORADA


UMA NOVA VIAGEM 


No sítio, no vale virtuliano do Rio do Peixe, por volta das duas horas da manhã, Nhô preparava um café para acompanhar a saborosa broa:
- Nhô, só por este café com broa, feito pelo senhor, vale a pena vir de Arret até a Terra – elogiava o Kobauski.
- Brigado, Kobausqui! Ieu queru qui ôce mi responda uma pregunta!
- Pode fazê-la, Nhô!
- Tem muntcha coisa vinu si chocá cum a nossa Terra?
- Tem Nhô!  Um meteoro, que passou a novecentos mil quilômetros de distância  e tinha  mais ou menos cem metros de diâmetro, foi o único que captei antes de iniciar a viagem transitória. Em novembro próximo, um cometa vai passar, não tão perto, mas vai dar para avistá-lo até de dia, porém não há perigo. Este cometa não tem nada a ver com a velha morada.
- Foi bom você ter vindo, Kobauski e esclarecido sobre isso para nós. Ficaremos menos preocupados – falei-lhe.
- I comu vai nossus amigu lá em Arret – perguntou o Nhô.
- Ótimos! Quando os vir vão estranhar a diferença. O Stephan, Beijo e Juliano vão com uma expedição a um sistema solar que fica na constelação de Libra em missão de pré-colonização; lá existe um planeta idêntico à Terra que orbita a estrela Gliese – como é batizada aqui na Terra. Tem quase a mesma massa, órbita semelhante em distância em torno de uma estrela, como este Sol daqui. Tem temperatura semelhante, água líquida e atmosfera com poluição, praticamente zero. Já o detectamos a cinquenta anos terrestres e desde então o temos estudado. Já temos uma rota que podemos usar para viagens transitórias sem perigo nenhum. Daqui da Terra até lá são vinte anos luz de distância.
- Mas, Kobauski, a nova morada não é a ideal para a sua raça – perguntei.
- Sim é seu Lê, lá ficaremos se nada acontecer – respondeu-me o arreteriano.
- Mas para que então essa, digamos assim, nova Terra?
- Porque lá criaremos uma nova raça humana. Vamos levar daqui da Terra, só três casais de cada animal e o banco de sementes que induzimos há muito tempo as nações terrestres a montarem – interrompi o alien:
- “Criaremos uma nova raça humana”..., você disse, não entendi – falei-lhe.
- É o seguinte, seu Lê, eu explico: lá já existe uma espécie de ser bípede tal qual existiu aqui na Terra há muitos anos. São extremamente primitivos. Estamos em estudos avançadíssimos e prestes a chegar a uma conclusão. A cadeia de DNA é quase  igual à de vocês humanos. Falta-lhes o gene da inteligência e do raciocínio lógico – interrompi o Kobauski:
- Então são mais semelhantes aos nossos simeos!
- Não, meu amigo, o aspecto deles é de humanos como vocês. Faremos lá modificações genéticas e, eles em gerações futuras – não muito distantes – tornar-se-ão como vocês humanos.
- Entendi, mas porque não fazem essas modificações genéticas usando a sua raça, Kobauski? Não deu certo com você e a chinesinha, mãe do Etevaldo?
- Deu certo em termos, pois o Etevaldo é estéril. Por mais que tentamos não tem como torná-lo fértil. É um defeito genético que não tem conserto. Com o Etevaldo só clonando e os clones sairão como ele: irreprodutível! É a natureza informando que não é viável criar uma raça assim.
- Entendi..., acho que entendi! – falei-lhe.
- E quando essa expedição partirá para a Terra II? Podemos chamar assim?
- Sim, na verdade é esse a denominação. Partiremos em comboio em poucos meses terrestres. O senhor e o Nhô gostariam de ir nesta expedição?
- Ieu já tô prontu – falou o Nhô que tirava outra broa do forno e a fatiava.
- Êita! "véi" aventureiro, só!
- Eu, também, irei com certeza, é só me avisar - reservei a minha vaga na viagem.
- Então está acertado, quando faltar dois dias terráqueos, mandarei avisá-los, ok?
- Ok, Kobauski, combinado!
- Eh! Eh! Aí, seu Lê, u sinhô só cumeu um tiquim di nada da broa; tá ruim?
- Não Nhô. É que eu ando com uma gastrite horrível e uma dorzinha enjoada do lado esquerdo da barriga; quando chegar em casa vou ver isso com um médico de estomago.
- Bom, a prosa está muito boa, mas tenho que ir para Arret!
- Você se esqueceu do meu pedido especial, Kobauski – perguntei.
- Claro que não, meu amigo, vamos até ao portal na caminhonete para buscá-lo. Terão que fazer duas viagens, pois só dá para trazer um de cada vez. São domesticados para viverem confinados e foram aperfeiçoados para comerem pouco, mas comem qualquer tipo de alimento.
- Ué, du que qui ôceis tão falanu?
- Vamos lá buscar o primeiro – falei
Ao chegarmos perto das duas pitangueiras, Kobauski levantou a mão direita e pronunciou duas palavras e o portal surgiu. Ele entrou e trouxe...
- Óia só, seu Lê, dois java-porcu i dus bitelão – espantado gritou o Nhô.
- Ah! E eu pensando que você teria esquecido, hein Kobauski?
- Seu pedido é uma ordem amigo Lê! Fala para a sua amiga que não precisa nenhum cuidado especial com eles. A única trabalheira que ela vai ter é que eles bebem muita água, aliás, qualquer tipo de água, ok?
- Intão essis bichão tão feitchu, us chiquêro da Xerê fica quaji drentu da sanga, linhais, eis não tem cercadu nus fundus que dão drentu da sanga – falou o Nhô.
- Ótimo para eles então – falou o Kobauski e prosseguiu:
- Seu Lê, encoste a GMC naquele barranco lá perto da estrada que fica na altura certa para eles entrarem na caçamba da caminhonete. Sabe, pensando melhor, acho que vai dar para levar os dois de uma só vez; a carroceria e bem grande!
Dito e feito. Meio apertados, mas deu para colocar os dois para fazermos uma só entrega à Xerequéia.
- Senhores, tenho que ir. Mandarei um mensageiro dois dias antes de nossa partida para a Terra-II, ok?
- Ok, meu amigo – respondi-lhe.
- Intão inté, intão, Kobausqui!
Kobauski entrou no portal, fez um sinal e disse três palavras e o portal se fechou.
Exatamente às seis horas e um minuto rumamos para o casebre da nossa amiga a fim de lhe entregar os dois presentes.
E, lá chegando, Xerê estava na beira da sanga dando de comer à grande quantidade de java-porco. Aproximamos com a GMC e ela:
- Caramba gente, mas que animais bonitos!
- São us qui u seu Lê ti prometeu, veia assanhada, lembra?
- Lembro sim “véi”, mas de onde eles vieram?
- Isto não tem a menor importância, amiga. O que importa é que de hoje em diante terás reprodutor para um bom tempo.
Xerê chegou às lágrimas:
- Muito obrigado! Vocês são realmente de minha família!
- Você merece amiga! Faça bem proveito – disse-lhe.
- Eu convido vocês para o almoço de páscoa comigo! É um meio de lhes agradecer, ok?
- Ok, Xerê, lá pelas  treze horas nos voltaremos aqui. Agora temos que ir ok?
- Ok, meus amigos, muito agradecida!
Deixamos os cachaços no mangueirão perto da sanga e falei ao Nhô:
- Vamos parar na padaria do Portuga e tomar café e depois vamos passar lá no acampamento do Ison Comet e ver se ele se lembra de alguma coisa do que aconteceu, ok?
- Tô cuntigu, misifiu!
Ficamos na padaria proseando e degustando pastéis de Belém que o seu Manoel faz como ninguém. Resolvemos, então, irmos à delegacia falar com o Carabina, antes de nos dirigirmos à tenda de Ison,  e ao engatar a primeira marcha na Vermelhona e sair, ouvimos um estouro:
- Furou um pneu traseiro, Nhô! Vamos perder uns quarenta minutos para trocá-lo!
- Fazê u quê né, seu Lê? Temu que trocá iele, eh! Eh! Eh!

Na delegacia por volta de nove e vinte e dois minutos: 
- Eu, seu Carabina, tenho certeza no que te digo. Ontem a noite não teve culto por causa da morte daquela obreira e eu fui para casa. Hoje, por volta das oito e trinta e cinco, fui até ao local da tenda e não tinha nada lá. Estava tudo vazio! Parece que nunca teve ninguém lá – falava Xerequéia meio apavorada.
- Bom dia, pessoal – cumprimentei todos na delegacia.
- Bom dia seu Lê, Nhô... – responderam os presentes.
- Ouviu isto, seu Lê? O pastor, cujo nome é Ison Comet, sumiu “no rastro do cometa”; segundo a Dona Xerequéia. Mandei o cabo Tição lá, com uma viatura, buscá-lo.
- Eu ouvi e já imaginava isso, delegado. Quando vínhamos para Virtuália, antes de pegarmos a rodovia Sideral, vimos uma carreta esquisita passar no entroncamento, acelerando e desrespeitando as leis de trânsito, pois estava a mais de cem quilômetros por hora. Foi a alta velocidade que chamou - nos a atenção para ela; não é Nhô? – falei
- É issu memu Carabina e a carreta era toda vermeia i amarela cuns desenhu isquisitu – respondeu o Nhô.
- Vamos esperar a volta do cabo Tição, mas tenho quase certeza que o tal pastor fugiu. Mas, não houve crime. A dona Rolecina morreu de um ataque cardíaco fulminante. Queria só o depoimento do pastor para arquivar o BO!
- Parece que é o mais lógico, Carabina. Já que não há mais o que fazer, mas... - fui interrompido.
- Nhô, seu Lê, vocês vão almoçar comigo lá no meu casebre, lembram? Eu preparei uma comida especial, ou seja, lombo de java-porco recheado com calabresa. E tem, também, salada verde – rúcula, alface e almeirão – maionese e suco de laranja com acerola. Além, é claro, da caipirinha com a purinha do Nhô. Hoje de manhãzinha, quando vocês foram lá em casa eu fiquei tão contente com o presente que me esqueci de dizer que ontem, quando fui atrasada para oculto, pois preparava o almoço de domingo de páscoa, já não tinha ninguém lá e o pastor foi muito estúpido comigo. Ele me disse que não me conhecia e que procurasse outra igreja. Ah, agora me lembro! Eles estavam carregando uma carreta vermelha e amarela da mesma cor da que vocês viram!
- Nóis vai armoçá cocê, misifia, pódi aguardá – falou por nós dois o Nhô.
Duas horas e trinta minutos, logo após o delicioso almoço de páscoa na moradia da Xerê, voltávamos para o sítio do Nhô e, na boleia da GMC, ele me perguntou:
- Pru que ôce num deu u indereçu, di vera, du pastô prô delegadu, seu Lê, ôce num viu tudim naquéias mánicas?
- Eita “véi” esperto, sô! Acontece que o caso foi arquivado e se eu falasse, o delegado ia querer saber onde eu tinha conseguido as informações e daí... - Nhô corta a minha conversa:
- Daí é qui ieu já intendi, misifiu!
- Nhô, quando chegar ao teu sítio vou tirar um cochilo embaixo do parreiral de uva, ok?
- Tá bão, misifiu! Ôce viu qui ieu coloquei uns ganchu di rede lá?

- Isso mesmo, meu amigo, e depois da soneca vou ter que voltar para casa, aliás, para outro tipo de sítio e terminar o descanso do feriado com a patroinha!
- Ôce é qui sabe, seu Lê!
No sítio:
- Seu Lê, achu mio u sinhô colocá a redi na varanda da cunzinha; óia só u temporá qui tá armanu lá nu horizonti!
- Tem razão Nhô, vou fazer isso! Depois da chuva eu me mando!
- Intão tá, intão. Vô aproveitá prá coiê umas uvas madura, antes da chuva, procê levá para a tua patroinha, tá bão?
- Tá bom, “véi”, a Rô adora uvas, suco de uvas, picolés de uva, sorvete de uvas, aliás, tudo o que é de uva ela...

- Ei Lê, acorda! Sai dessa espreguiçadeira que já está começando a chover. Olha só o toró que tá vindo lá do lado do oceano! Venha tomar café e saborear as uvas importadas que o Reinaldo trouxe lá da importadora da cidade. Levanta logo e vamos ajudá-los a preparar o almoço de páscoa – falava a Rô ininterruptamente.
- Tá ok, paixão, mas antes vou tomar um antiácido e umas cem gotas de dipirona que essa gastrite e essa dorzinha no lado esquerdo da barriga “tá me matando”!
- IIIIhhh, Lê você tem que ver o que pode ser isso, com doença não se pode facilitar!
- Tá, assim que chegar a Juiz de Fora eu prometo que vou ver isso!

Continua em:

TERRA II






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