Peripécias de
MOLEQUES
EPÍLOGO:
Galo na CABEÇA
" Aquele foi o dia mais logo da minha vida. Qualquer garoto com quem conversava me perguntava
-
E aí, Lê, vai ver o filme?
-
Depende do galo – rebatia.
Eles riam e
deviam pensar que eu estava ficando maluco.
Enfim, dezoito horas! Fui até a casa da Dona Geralda e não deu outra coisa: a dezena
do GALO NA CABEÇA e cinquenta cruzeiros no bolso. A Dona Geralda, como era
camarada, me antecipou o dinheiro do prêmio. Voltei para casa, troquei de camisa,
calcei os sapatos e falei para minha mãe que iria ver o filme da sessão das
dezoito horas e que já estava atrasado. Em Muriaé, essa sessão era comum nos períodos de
férias de verão.
Ao retornar
para casa, por volta das vinte horas, esperavam-me minha mãe, meus irmãos, meu
pai e a Dona Maria Perereca; e, foi o seu Nelson quem, com tom autoritário de
voz, quem abriu o diálogo:
- Lê, esta senhora disse que um menino mexeu com ela e
ela o acertou com uma velha panela na cabeça. E está afirmando que o menino
parecia contigo, que levava gibis nas mãos, e depois de acertado, saiu
correndo, gritando se esvaindo em sangue!
-Que é isso, pai, vê se eu tenho, pelo menos, um GALO NA
CABEÇA?
Claro que
não tinha e a história ficou por isso mesmo, mas antes tive que explicar ao meu
pai onde arrumara dinheiro para ir ao cinema:
-Fale, Lê, onde você arrumou o dinheiro do cinema?
- Eu vendi alguns gibis pai e uns alumínios velhos que
encontrei inclusive aquela bacia velha que deixaram no quintal. O senhor não se
lembra?
Meu pai
resmungou alguma coisa que eu não entendi e foi tomar seu atrasado e merecido
banho.”
- E o pai às vezes chama a gente de arteiros, não é
Thiago?
- É mesmo Felipe – respondi.
O diálogo
foi interrompido pela única voz feminina da nossa família, a de minha mãe:
- Meninos, é tarde e o lanche já está pronto; venham
comer, escovar bem os dentes e direto para a cama. Está muito bonita a conversa
de vocês, mas já estão a três horas conversando!
- Mas mãe, nós estamos de férias e as histórias do pai
são muito divertidas – tentei ponderar.
- Vocês estão de férias, não é mesmo? Eu e seu pai
amanhã, às seis horas, teremos que estar em pé, ok? Vamos logo e não demorem – completou a
Dona Rosângela, minha mãe, sem dar-nos outra chance.
Meu pai
levantou-se de sua poltrona predileta e foi colocar um filme no DVD. Começamos a
assistir, pelo menos enquanto terminávamos o lanche. E era, justamente, o filme mencionado na história que ele acabara de contar. No seu desenrolar, os olhos do meu pai
brilhavam como os de um menino e percebi que ele estava ali, na nossa infância,
mas seus pensamentos se encontravam no dia de sua infância em que ele vira,
pela primeira vez, aquele filme. Às vezes fico pensando que a amizade e
liberdade que meu pai tem com a gente, eu e meus irmãos menores, é a mesma que
ele gostaria de ter vivido com meu avô Nelsão.
Fim
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